Elixandra cardoso, costura pensamento

"Tecendo silêncios e sentidos entre fios e pensamentos"

Meu Diário
07/05/2025 12h13
" Sem o Último Abraço" (mãe)

Faz seis meses que minha mãe partiu. E o que mais dói não é só a perda, mas o tempo que passou sem vê-la pessoalmente. Morávamos em estados diferentes, e nossa relação vivia pelo telefone. Falávamos quase todos os dias. Horas de conversa. Prometíamos que um dia nos veríamos de novo, mas esse dia nunca chegou.

 

Numa noite comum, liguei para ela. Quem atendeu foi uma tia / minha mãe estava no hospital. De fundo, escutei os gritos de dor. Pedi que ela levasse o telefone até minha mãe. Mesmo sem forças, escutei sua voz sussurrando: “Não aguento falar.” Ainda assim, pedi: “Tia, leve o telefone.” E falei:

“Mãe, não fale nada. Apenas me ouça. Tenha força. Pense no seu Deus, no seu caminho. Confie, sem medo.”

Ela respondeu com um sussurro que ainda ecoa em mim:

“Rumm... ....parece que hoje é meu último dia.”

 

A ligação caiu. E com ela, caiu também o chão.

 

Às 5h50 da manhã, o telefone tocou novamente.

“Mãe........ acabou de falecer minha vozinha.” isso minha filha falando 

Foi um choro solto, desesperado. Um mundo se despedaçando.

 

O quarto ainda escuro, o ventilador rodando, a cortina se movendo como se dançasse um adeus. Lembro de sentir uma explosão química dentro de mim / adrenalina, cortisol / um entalo no peito. Minhas crianças ainda dormindo. Fui até a varanda. A chuva começou a cair. Olhava cada gota como se fossem lágrimas do céu. Chorava. Parava. Chorava de novo.

 

Um turbilhão de perguntas me invadia. Mil e uma culpas.

“Ela morreu mesmo? Ou foi só seu corpo que se desgastou?”

“Teria sido um plano de alma antes de nascer?”

“Será que meu sofrimento é puro egoísmo?”

“Se eu a amasse de verdade, deveria aceitar sua partida em paz?”

 

Filosofei. Questionei. Mas, no fim, nenhuma filosofia dava conta da dor. A dor é crua. É real. E me desabei.

 

Decidi não ir ao velório. Era uma viagem longa, pesada, e pensei: “Se enquanto ela viveu eu não fui, não faz sentido ir agora.” Acompanhei tudo daqui. Seu funeral. Seu enterro. No invisível, tudo acontecia dentro de mim.....

 

Nada fazia mais sentido. O pôr do sol perdeu a cor. Tudo ficou cinza.

 

Hoje, seis meses depois, minha vida segue em oscilação. Há dias de alegria. Outros de profunda tristeza. Às vezes, sinto só um buraco, um vazio. Já não choro mais. Estou naquela fase onde restam as perguntas silenciosas, o desânimo. Vivo mais na rede do que na rotina. Emagreci sete quilos. Tenho insônia. Pensamentos intrusivos. Mas estou aqui.....

 

E é nesse vazio de saudade que procuro força.

A escrita é o que me alivia.

Talvez seja ela que me devolva, aos poucos, à vida......

 

Epílogo – Quando a dor vira ciência

 

Hoje, com mais lucidez, comecei a estudar as reações químicas que vivi naquele momento. A curiosidade me levou a tentar entender por que senti tanto, o que aconteceu no meu corpo e no meu cérebro. Queria transformar aquela dor crua em compreensão.

 

Descobri que o luto é mais do que uma ausência / é uma reação biológica complexa. A Neurociência mostra que perder alguém ativa regiões cerebrais ligadas à dor física, como o córtex cingulado anterior. É como se o cérebro não soubesse distinguir entre uma dor emocional e uma fratura. Ambas são reais. Ambas doem....

 

Durante a perda, há uma descarga de cortisol, o hormônio do estresse. O corpo entra em estado de alerta. O coração acelera, o apetite some, o sono falha. Adrenalina também é liberada, o que pode causar tremores, tensão muscular e sensação de sufoco. E com o tempo, a falta de dopamina e serotonina / substâncias ligadas ao prazer e ao equilíbrio emocional / nos mergulha em um vazio que chamamos de tristeza, mas que é também um desajuste químico.

 

Muitos dizem que, do ponto de vista neurológico, o luto não deveria ultrapassar três meses. Mas quem já perdeu alguém sabe: o tempo da alma não segue relógios. A dor pode adormecer, mas continua ali, sob a pele, à espera de um cheiro, uma música, um silêncio.

 

O cérebro, ao tentar se adaptar à ausência, passa por fases. Primeiro o choque. Depois, a negação. Em seguida, a raiva, a tristeza profunda, a culpa / todas acompanhadas por variações hormonais intensas. Só depois, com muito tempo e reconstrução interna, vem a aceitação.

 

Hoje entendo que não enlouqueci naquela madrugada. Meu corpo apenas reagiu àquilo que o coração não suportava sozinho. E se a ciência me ensinou algo, foi que sofrer não é fraqueza / é humano. É químico. E, paradoxalmente, também é espiritual.

 

A escrita, por sua vez, tem sido o meu remédio. Um espaço onde minha alma e meu cérebro tentam se entender.

 

E talvez seja assim que eu vou vivendo: entre hormônios e palavras, entre ausência e reconstrução.

 

Entre o silêncio da perda…... e o som da vida que, aos poucos, volta a sussurrar.....

 

Reflexão final 

 

O corpo é físico,emocional e espiritual, então queria achar a cura ou completude.....

Como tudo, pra mim, vira estudo, fui estudar para compreender como era o funcionamento do meu corpo naquele momento. No fundo, eu queria achar uma solução / quase uma receita / para sair da depressão. Era como se o meu cérebro dissesse: "Agora é sua vez de morrer, o sofrimento acaba aqui."

 

Mas tentei fugir desse pensamento. Compreendi que o cérebro não é mal / ele só busca uma solução para o problema. Ele tenta resolver, mesmo sem saber o que é certo. Ele não sabe diferenciar o real do irreal, e por isso, quando estamos vulneráveis, ele pode nos conduzir a becos escuros, acreditando estar ajudando.

 

Aos poucos, estou me levantando. Reconstruindo pedaços por pedaços. Lentamente. Estou fazendo exercícios, voltando a costurar, vendo pessoas. Aprendi que não posso me isolar do calor dos outros. Ainda não recuperei o peso. Fui ao médico. Ainda não durmo bem. Mas estou fazendo tudo no meu tempo.

 

E estou escrevendo. E escrevendo. Porque é assim que me mantenho viva.

 

E talvez, nesse vazio de saudade, eu encontre / na escrita, na ciência, nas pequenas rotinas / a força silenciosa para continuar....

 

CENA FINAL – O ECO DA VELA

 

Luz suave no palco. Ao centro, uma rede levemente balançando. À direita, uma máquina de costura antiga, coberta por um tecido branco. Ao fundo, uma janela aberta com uma cortina leve esvoaçando. Chove lá fora. No chão, uma vela derretida, quase apagando. Ao lado, um caderno aberto com uma caneta descansando sobre ele.

 

(A personagem principal está sentada na rede, olhando para o nada. A luz da vela vacila. De repente, uma brisa atravessa o palco. A vela apaga suavemente. Silêncio. Um leve som de máquina de costura começa a ecoar ao fundo, como memória.)

 

VOZ DA MÃE (em off, suave, mas firme, como um sussurro vindo do tempo):

Filha....... estou bem.

 

(A personagem levanta lentamente a cabeça, os olhos se enchem de lágrimas contidas.)

 

VOZ DA MÃE:

Estou aqui, costurando tecidos por outras bandas...

Não se preocupe, onde estou agora, as linhas não se rompem mais.

Costuro estrelas com pontos firmes, remendo saudades,

E bordo flores nos sonhos de quem ainda sente minha falta.

 

(A luz da cortina fica dourada por instantes. A personagem se levanta, caminha até a máquina de costura, toca no tecido.)

 

PERSONAGEM (emocionada):

Mãe…... eu ainda te escuto, mesmo quando o mundo silencia.

O som da tua risada está guardado no fundo do meu peito.

E mesmo que a vela tenha apagado..… o eco continua.

 

VOZ DA MÃE:

A chama se apagou, filha…..

Mas o calor permanece em tudo que você toca, em tudo que você escreve.

Eu não fui embora.

Apenas costuro agora no pano invisível do teu caminho....

 

(A luz volta a subir suavemente. A vela se reacende sozinha, bruxuleando. A personagem volta a escrever no caderno. Um raio de sol atravessa a janela.)

 

PERSONAGEM (sorrindo, em voz baixa):

Vou continuar, mãe…....

Remendando minha alma com tua lembrança.

Costurando minha vida com teus ensinamentos.

E bordando esperança no tecido dos meus dias…...

 

Luz apaga devagar, com o som da máquina de costura ecoando como uma batida de coração. FIM.

 

No som baixo de: 

 

Comptine d'un Autre Été -yann tiersen -theChiefEmperor ....

Alexleanh...... 

 

Interstellar-Main Theme- Hans Zimmer ( Epic instrumental/piano cover)

Jacob's piano

 

Titanic- My Heart Will go on ( instrumental)[HQ]

Shinjeez

 

Passacaglia- Handel Halvorsen / Relaxing Piano music

William Freeman 

 

Essas foram as canções que ouvir no dia em que ela viajou.......E até hoje escuto.....

 

Chorei.......

Chorei.........


Publicado por Elixandra ( costura pensamento) em 07/05/2025 às 12h13
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