Elixandra cardoso, costura pensamento

"Tecendo silêncios e sentidos entre fios e pensamentos"

Textos


"Álcool e Embriaguez: Diálogo entre o Cálice e o Abismo"

 

Era uma noite morna.

Na beira de uma consciência cansada, dois velhos conhecidos se encontraram: o Álcool e a Embriaguez.

 

O Álcool, alquimista dos líquidos, vinha de laboratórios, uvas esmagadas, cereais fermentados e tradições antigas. Sabia de química, de cultura, de história.

Tinha perfume de festa, voz de riso solto e promessa de alívio.

A Embriaguez, por sua vez, chegava depois >> cambaleante, doce, trágica.

Era emoção crua. Era o outro lado da chave. Era o afrouxamento do Eu.

 

Sentaram-se frente a frente, dentro do peito de um homem que só queria esquecer.

 

“Sou apenas uma substância”, disse o Álcool. “Faço sinapses desacelerarem, dopamina dançar, julgamento vacilar. É fisiologia. Nada mais.”

“E eu sou a libertação”, sussurrou a Embriaguez. “Sou o grito que ele nunca deu, o abraço que ele não teve, a coragem que a lucidez negou.”

 

Mas no meio da conversa, surgiu uma terceira figura: a Consciência.

Vinha lenta, como quem acorda de um sonho turbulento.

Trazia perguntas.

 

“Por que o prazer precisa da fuga?”, ela perguntou.

“Por que o corpo pede mais quando já está no limite?”

“E por que a dor volta mais forte quando a embriaguez vai embora?”

 

O Álcool tentou se defender: “Não sou o erro. Sou a escolha. Sou o meio, não o fim.”

A Embriaguez suspirou: “E eu sou só o reflexo do vazio que ninguém cuida quando está sóbrio.”

 

A ciência diria que tudo isso são reações químicas: o etanol cruzando a barreira do sangue-cérebro, silenciando o lobo frontal, liberando o que estava trancado.

Mas o coração sabe que, por trás disso, mora o desejo de não sentir. Ou de sentir demais.

 

Muitos buscam no copo aquilo que o mundo não oferece:

Paz, coragem, esquecimento, amor, ou simplesmente um intervalo.

 

Mas o copo é um espelho: devolve distorcido o que você derrama dentro dele.

 

O certo e o errado não moram na bebida.

Moram na intenção, na frequência, no porquê.

Moram na fronteira entre o querer e o precisar.

 

No fim, Álcool e Embriaguez partiram.

Deixaram a Consciência com gosto amargo na boca e uma pergunta na alma:

 

“Você está bebendo para brindar à vida… ou para fugir dela?”

 

Ensaio filosófico poético pega de prosa

 

Isso é tudo...

Elixandra ( costura pensamento)
Enviado por Elixandra ( costura pensamento) em 22/04/2025
Alterado em 24/04/2025


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