![]() Faltava: chamado desejo reprimido
Faltava. Não era fome, sede ou sono. Era outra coisa >>dessas que não se vê, mas aperta no meio do peito, como roupa costurada torta. Faltava um gesto, um toque, uma liberdade que nunca foi nomeada. E lá no fundo, entre as dobras bem passadas do comportamento, morava ele: o desejo. Não o desejo barulhento que arromba portas, mas o que sussurra e espera, paciente, o dia em que alguém vá escutá-lo.
Desejo reprimido tem cheiro de armário antigo. Mora onde a gente esconde o que não teve coragem de ser. É vontade travestida de conformismo. É o não dito nos olhos que desviam, na palavra que engasga, no corpo que desaprendeu a pedir.
A alma sabe. Mesmo quando o rosto finge, o corpo denuncia: um tremor na mão, um suspiro profundo, ou o silêncio que pesa mais que grito.
Faltava. Mas ninguém sabia dizer o quê. Talvez porque ensinaram que querer demais era feio, que sentir era fraqueza, que sonho grande era coisa de gente que esqueceu o lugar.
E assim, o desejo foi ficando ali, calado, alinhavado, dobrado em quatro dentro do peito. Mas ele não morreu. Desejo não morre. Ele se transmuta em insônia, em impaciência, em tristeza sem explicação.
O chamado segue vivo, mesmo que sussurrando. E um dia, quando a costura da vida arrebenta de vez, ele escapa > feito botão solto na roupa velha, gritando sua ausência com força de verdade guardada tempo demais.
Moral da história
Desejo reprimido não desaparece > ele se desloca. A psicanálise já dizia: o que não é elaborado, retorna como sintoma. A neurociência confirma: o sistema límbico guarda impulsos que, se negados por tempo demais, explodem em ansiedade, insônia, até doenças psíquicas.
Epicteto e os estoicos alertavam: é preciso dominar os desejos, pois ser escravo deles é perder a razão. Mas, por outro lado, Nietzsche rebate > chamando o desejo de força vital, motor da criação, vontade de potência que empurra o ser à transcendência.
No meio disso, talvez esteja a sabedoria: nem negar o desejo a ponto de atrofiá-lo, nem ser levado por ele como vento sem leme.
Reconhecer, escutar, acolher > porque o desejo reprimido não quer gritar. Ele só quer existir, com a dignidade de quem foi ouvido.
Spinoza, com sua clareza serena, propôs outro equilíbrio: não o apagamento do desejo, mas seu entendimento. Para ele, desejar é afirmar a vida > e a sabedoria está em compreender nossos afetos, não em negá-los, nem em se render a eles sem consciência.
Já Simone de Beauvoir nos lembra que negar os próprios desejos, sobretudo os mais íntimos, é negar a própria liberdade de ser. E que muitas vezes, o desejo reprimido não é pecado > é só o eco daquilo que fomos ensinados a temer. No fim das contas, o que desejamos com mais força, costuma ser o que há de mais vivo em nós. E sufocar isso… é costurar o próprio peito com linha grossa demais.
Leitor
Chega mais, que aqui o assunto é de dentro. Se o seu desejo anda calado, se a alma às vezes pesa e você nem sabe o nome do que falta… essa prosa é sua também.
Puxa uma cadeira. Aqui a mesa é farta de escuta, a palavra é temperada com afeto e a tesoura tá na mão >>>>>> não pra cortar o que você é, mas pra aparar as pontas do que já não serve mais.
Entre um gole de café e outro de coragem, a gente se pergunta: O que você tem silenciado? O que sua vontade tem pedido baixinho, com medo de ser ouvida?
Vem com calma. O fio da vida, às vezes, é mais sobre costurar o que sentimos do que sobre entender tudo.
E quem sabe, nesse remendo de palavras e vontades, você descubra que o que faltava… ainda mora em você.
ensaio poético-filosófico.
É isso
Elixandra ( costura pensamento)
Enviado por Elixandra ( costura pensamento) em 24/04/2025
Alterado em 24/04/2025 Copyright © 2025. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. Comentários
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