Elixandra cardoso, costura pensamento

"Tecendo silêncios e sentidos entre fios e pensamentos"

Textos


O Retalho da Aurora: (costuras pra não deixar o tempo desfiar)  

 

“Não é que tenhamos pouco tempo, mas sim que perdemos muito.”

_ Sêneca_

 

Dona Aurora tinha 78 anos e uma rotina que não mudava: toda manhã, puxava a cortina de renda da janela e sentava-se à beira de uma velha máquina de costura. Passava horas alinhavando pedaços de pano, que ela mesma cortava, escolhia e juntava. O barulho do pedal já fazia parte da paisagem da rua.

 

A vizinhança, no entanto, comentava.

 

>< Essa velha tá ficando gagá. Costurando pano velho todo dia...... e pra quê? >< dizia a moça do salão.

 

>< Parece que ela conversa com as formigas! >< acrescentava o entregador do mercantil.

 

Na verdade, Dona Aurora era discreta. Falava pouco e ouvia mais. Vivia sozinha desde que o marido partiu, anos atrás. As únicas companhias eram um gato preto preguiçoso e as formigas que passavam rente ao batente da porta, carregando farelos.

 

Certa tarde, a menina da casa ao lado, chamada Lúcia, resolveu perguntar. Tinha uns dez anos e observava Aurora com curiosidade crescente.

 

>< Dona Aurora, por que a senhora costura tanto, se ninguém usa essas colchas?

 

A velha sorriu sem mostrar os dentes.

 

>< Porque o mundo anda rasgado, minha filha. E tem gente que nem percebe. Eu costuro pra lembrar que ainda dá tempo de remendar.

 

A resposta ficou martelando na cabeça da menina. Principalmente porque, nos dias seguintes, a máquina ficou em silêncio. Aurora não apareceu na janela. Não ligou a luz do quartinho. Nem deixou migalhas pras formigas.

 

No fim da semana, a notícia correu: Dona Aurora tinha partido. O velório foi simples. A colcha inacabada ficou estendida sobre a máquina, como se ainda esperasse o último ponto.

 

Lúcia passou a visitar a casa com a mãe. Pediu pra ficar com a máquina. Começou a aprender a costurar. Os pontos saíam tortos, os retalhos não combinavam. Mas ela deixava sempre um pedacinho de pão no chão, só pra ver se as formigas voltavam.

 

E toda vez que o pedal fazia barulho, ela pensava: talvez o mundo ainda tenha jeito.

 

Epílogo Analítico: “O Retalho da Aurora”(costura pra não deixar o tempo desfiar)

 

-> Personagens Principais:

 

Dona Aurora: idosa solitária, silenciosa, que encontra na costura uma forma de resistência e cuidado. Representa sabedoria, tradição e sensibilidade.

 

Lúcia: menina observadora, curiosa e receptiva. Representa a nova geração e a possibilidade de continuidade dos valores de Aurora.

 

-> Ambiente:

 

Uma rua simples e rotineira, com vizinhos que observam e comentam.

 

A casa de Dona Aurora, especialmente o espaço da costura (perto da janela, ao lado do pedal, com presença de formigas e um gato preto), é um microcosmo de quietude e resistência.

 

-> Ação Principal:

 

Dona Aurora costura retalhos todos os dias, em silêncio, como se estivesse remendando o próprio tempo e o mundo ao seu redor.

 

-> Conflito:

 

Externo: a sociedade que desacredita e desvaloriza os gestos simples e o tempo desacelerado >< representada pelos vizinhos e pelo mundo moderno apressado.

 

Interno (subentendido): a solidão de Aurora e seu enfrentamento sutil à perda e à efemeridade da vida, por meio da costura.

 

-> Desfecho:

 

A morte de Dona Aurora marca uma pausa na rua e um silêncio simbólico.

 

Lúcia herda a máquina de costura e começa a repetir o gesto da velha, mesmo sem entender tudo ainda. A continuidade dá esperança de que os valores de cuidado, presença e resistência ao tempo não se percam.

 

 

->  Moral (mensagem):

 

Em um mundo que valoriza a velocidade, a produtividade e a visibilidade, os gestos silenciosos e lentos >< como costurar, cuidar e observar >< são formas profundas de resistência e de cura.

 

Pequenas ações podem sustentar grandes significados.

 

Ensinar pelo exemplo deixa marcas mais fortes do que impor palavras.

 

 

-> Sentimentos Apresentados:

 

Ternura >< no gesto repetido de costurar com paciência.

 

Solidão com dignidade >< Aurora vive só, mas com sentido.

 

Desconexão social >< os vizinhos olham, mas não entendem.

 

Resistência silenciosa >< costurar como forma de lutar contra o caos e o esquecimento.

 

Esperança e legado >< a menina que aprende a costurar representa a possibilidade de continuidade e transformação.

 

estrutura é de conto,Linguagem lírica ( metafórica,filosófica reflexiva)

 

"A leitura é guiada pelo olhar subjetivo de quem lê, sendo interpretada de formas diversas conforme suas crenças, limitações e experiências. Por isso, um mesmo texto pode conter múltiplos significados."

 

Nota de quem borda com palavras:

 

Já escrevo e faço reflexões há longas datas >< é só conferir em outras redes sociais que costumo usar........

Recebi a indicação de um conhecido sobre o Recanto das Letras e, cá estou. Confesso: fui surpreendida por muitos textos de vocês >< alguns me fizeram silêncio, e esse silêncio foi meu corre-força   em meio a tristeza da viagem de minha amada mãe, que resolveu 

costurar pano em outro plano........

 

 

 Eu gosto de reler o que escrevo...........

 

Aprender com vocês também..................

 

 Já foi bonito só de ter nascido eu,  e vocês..........

 

É isso........

Elixandra ( costura pensamento)
Enviado por Elixandra ( costura pensamento) em 05/05/2025
Alterado em 07/05/2025
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